O texto escrito no Natal do ano passado, nunca publicado, é melhor do que meus rascunhos atuais sobre o tema. Por que não publicá-lo? As realizações mudaram, mas a reflexão continua valendo…
Então chega o fim do ano. Amigo secreto, 13°, confraternizações, perus, espumantes, IPVA, IPTU, presentes, arroz com passas, promessas de ano novo e especial do Roberto Carlos. Tempo de comilança, correria às compras e reflexão, por mais contraditório que possa parecer. Tempo de ouvir aquela música chiclete da Simone. Então é natal, o que você fez? Eu, caí. Tive hemorragia cerebral, quebrei uma vértebra cervical, colocaram 9 placas de titânio no meu pescoço, sofri mais de 2 meses com labirintite e estou entrando no último dos 3 meses previstos de uso do colar cervical. De longe, a coisa mais marcante que fiz no ano. Sei que não é dessas façanhas que costumamos falar, mas não me ocorre algo mais marcante, nenhuma realização tão relevante, apenas este incidente, a benção de não ter sofrido consequências graves e irreversíveis do acidente doméstico e o fato de estar me recuperando bem, ainda que lentamente.
OK, mas a reflexão de fim de ano demanda mais, exige que façamos um balanço do ano, que listemos virtudes demonstradas, deslizes cometidos e obras realizadas. É esperado algum feito considerável, algo notável ou digno de registro, mas nem sempre temos uma realização dessa grandeza para esfregar na cara do ano velho. Neste ano que passou, vivi bons momentos com a família, amigos e colegas de trabalho, exerci bem meu ofício, publiquei meu 2° livro de crônicas, fiz algumas pequenas doações, troquei de carro e superei momentos difíceis. Para alguns, pode parecer pouco; para mim não. As coisas mais importantes da vida estão aí: ser boa pessoa, superar obstáculos e sentir-se feliz, de bem consigo. Tenho o quinhão de felicidade que me é possível.
Não costumo mais fazer promessas de ano novo; para mim, não funciona, nunca funcionou. Tenho várias fotografias de fim de ano com o último cigarro na mão, embora tenha deixado o hábito nefasto no meio de um ano qualquer perdido no passado distante. Dietas, não faço, no máximo tento reduzir quantidades e melhorar qualidades à medida que minha consciência evolui e meu metabolismo involui. Aprendizados e projetos pessoais acontecem quando têm que acontecer, quando estão maduros. De uns anos pra cá, meus pedidos de ano novo ao pular as três geladas ondinhas do mar de Xangri-lá estão invariavelmente relacionados a ser menos exigente comigo e saber aproveitar a vida.
Quem me conhece, sabe, não sou homem de religião, embora tenha sido batizado e crismado na Igreja São Pedro e estudado no colégio Marista de mesmo nome. Isso deve fazer de mim um católico não praticante; assim deveria preencher os formulários quando perguntado sobre o assunto. Não vou à missa regularmente, mas presto atenção no que dizem os padres, e não esqueço o que disse um deles no enterro de uma tia. Lembro bem: não das palavras, mas do teor e do conteúdo. Disse ele: muitos católicos desejam ser santos, desejam ser protagonistas de atos de grande benevolência, alimentam o sonho de serem dignos de canonização, mas isso é pra poucos. Comece fazendo o bem aos mais próximos, aos que te cercam. Dê ouvidos e importância às pessoas, ajude quando puder, seja grato e demostre gratidão, por menor que seja o favor ou o serviço prestado. Assim, você estará sendo bom católico, estará fazendo a diferença, estará melhorando o mundo. Desde então, lembro daquele discurso quando chega a época do Natal e Simone pergunta o que você fez. Costumo responder com satisfação e uma ponta de velado orgulho: eu melhorei o mundo.
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